17 de dezembro de 2010

PADRÕES NARRATIVOS ELÍPTICOS


Depois de duas semanas de apresentações, começo a entender (um pouco) a peça que fizemos. A MILÍMETROS DE MERCÚRIO é desenhada a partir de imagens narradas em sonhos. Sonhos postados na internet por sonhadores anônimos. A proposta era, a partir dos sonhos encontrar o sonhado. Para isso, os sonhos sofreram desdobramentos realizados em sala de ensaio pelos atores de modo a estabelecer ligações com a história de cada um. As palavras encontras dentro de cada sonho serviam de ponto de partida para o futuro, para infância, para pedaços da vida a demandar significado. Sendo assim, dentro da narrativa de cada um dos personagens, alguns elementos de repetem num horizonte aberto, criando padrões narrativos elípticos. Estes elementos funcionam como o fato selecionado do matemático Henri Poincaré dando uma coerência (mesmo que temporária e parcial) ao conjunto narrativo. O resultado esperado é que na mente de cada espectador ocorra uma edição de narrativas visuais, cênicas, musicais, literárias de modo a constituir, inventar, criar a sua própria peça. A idéia que, pelo menos em parte isso se realiza, se expressa na percepção do público através de frases ditas depois das apresentações. As frases têm em comum a idéia de que alguma coisa não foi compreendida. E por simetria, algo foi captado. O espectador encontra-se assim frente à criação de sua própria narrativa, mas como não é habitual que o faça em parte por não se sentir autorizado a encontrar em si mesmo o eixo essencial das imagens oferecidas. Como se o espectador estivesse frente a um banquete exótico, e mesmo saboreado os pratos estranhos, ficasse intrigado em como fazer a digestão sem saber os nomes dos mesmos. Esse processo se estabelece na medida que as elipses narrativas criam um padrão invisível. Sonho como uma narrativa baseado na teoria do Caos na qual os padrões não sejam lineares e os processos de repetição não tenham uma relação tempo-espacial, mas sim num ambiente emocional propício para o encontro consigo mesmo. Desse modo, que quando cada personagem criado a partir dos sonhos que serviu de base para que o ator tentasse encontrar o sonhador, encontra-se também o imponderável e a falta de sentido. A falta de sentido é a condição inicial para a busca de significado. E nesta busca encontra as elipses oníricas que constituem, em ultima análise, a essência do sujeito do modo como ele essencialmente é. Por isso, as personagens são essência de um humano que correm, porém o risco de a qualquer momento de deixar de sê-lo. Tão instável que somos em nossas impermanêcias.

texto: Julio Conte

15 de dezembro de 2010

Teatro gaúcho de qualidade! (ClickRBS)

Fonte: ClickRBS


Crédito: Maria Eduarda Vieira da Cunha/ Divulgação

Nas duas últimas apresentações do ano, a peça A Milímetros de Mercúrio é uma atração bem bacana para a galera que curte teatro feito por aqui, de qualidade e com preço acessível. No espetáculo, os personagens são funcionários da Soneide, uma empresa de telemarketing que vende sonhos, tendo eles também sonhos de aspirações artísticas. A peça, com direção de Julio Conte, traz uma divertida crítica poética da sociedade moderna através de uma linguagem alegórica e até absurda.

Os personagens sofrem de pressão crescentes e acabam se defrontando com a coisa insensível dentro de cada um que assassina a subjetividade e os sonhos.

Confira o serviço da peça:
O quê: A Milímetros de Mercúrio
Quando: hoje e amanhã, às 20h.
Onde: Sala Carlos Carvalho da Casa de Cultura Mário Quintana, Andradas 736
Quanto: R$ 10.

ÚLTIMA SEMANA: A Milímetros de Mercúrio (15/12 e 16/12)




Pois bem, A MILÍMETROS DE MERCÚRIO estreou na quarta-feira. Na verdade, como aqui é um espaço íntimo, posso confessar que a estréia foi quase um ensaio geral. Não é o que eu gosto, nem o que costumo fazer, gosto de estrear bem estreado, tudo no seu lugar para dar tempo de evoluir de um ponto além. Mas, o ideal é uma meta quase nunca alcançada. Está aí, já há um bom tempo, o platonismo a nos ensinar que as formas perfeitas são experiências antes do nascimento. Depois, na vida, temos que lidar com as imperfeições. O psicanalista W.R.Bion segue esta mesma linha quando sustenta que a verdade é inalcançável e dela só podemos tomar contato com ela através da imaginação. Assim, suportando o limite impresso por algo que nos sobrepõe, posso dizer que a estréia abriu um caminho em direção a algo que nos espera. No segundo dia, um pouco menos histérico, o clima emocional foi encontrando o lugar que lhe era devido. A peça tem um potencial incrível. Os atores estão num equilíbrio incrível. Não se poderia destacar ninguém o que é o mesmo que dizer que o destaque são todos. A narrativa elíptica, se esgueirando do realismo, oferece espaço para a imaginação. As personagens se defrontam tragicamente com algo que as transcende e as supera. A coisa. Algo que ocorre que faz das personagens o contrário daquilo que elas sonharam para si. A coisa transforma as personagens em coisas. Desobjetializa, dessensibiliza, concreta a emoção e nos torna algo diferente do humano, do sonho humano, do sonho. As interpretações estão num nível impressionante. A cenografia do grupo é fantástica e a luz é condidata a prêmio, pois se destaca do senso comum.
Mas um ponto quero destacar, que talvez nem seja o mais importante, frente a exuberância das interpretações, mas como é recorrente no meu trabalho, me sinto na obrigação de falar. É a trilha. Não tem a vivacidade das trilhas ao vivo, mas tem um aspecto que merece destaque. O processo. Desde o início dos ensaios, a trilha faz parte das improvisações. Com meu notebook e milhares de músicas, vou testando ao longo do ano de processo criativo com o a grupo. Cada momento passa a se integrar e determinar a intepretação. A interpretação do ator dialoga com a trilha. A música não é para sublinhar, não vai sempre na mesma direção, a trilha é tensão. Como se o ator estive contracenando com a trilha. Emocionalmente. O resultado é que a rede sonora que conduz a cena entra em sintonia tensa com o ator desde o início. Daí que resulta, não numa trilha, não num pano de fundo para a ação dramática, mas um diálogo com a emoção do ator, a narrativa e o público. Acho que isso é um ponto tão essencial quanto o texto construido a partir de sonhos postados na internet por sonhadores anônimos. Sonhos estes que tivemos o cuidado de desenvolver, criar links de modo a imaginar o sonhador, uma vez que este é revelado pelo sonho.
A iluminação do Gabriel Lagoas trás novidades, assimetrias e diversidades. Poderia falar também da ambientação cênica proposta pelo grupo que favorece o clima onírico, remete a impressões sensoriais sem palavras como se estivemos frente a narrativas sem história. E o mais legal é que tudo se integra com uma harmonia sensível.
Concluindo, é uma virada nos meus trabalhos. O texto tem um caráter poético e a narrativa é mais emocional que que realista. E me sinto muito bem de enveredar por outras estéticas, já que a aventura teatral é como a vida, diversa e surpreendente e nossa mente confirma o que Shakespeare já afirmara de que somos feitos da mesma matéria que é feita os sonhos.

14 de dezembro de 2010

Uma intoxicação grave! (Amanhã, 15/12)


O mercúrio é um metal pesado que provoca intoxicação grave. Tele marketing devora a privacidade. Na mitologia, a comunicação e os negócios ficam a cargo do Deus Hermes que, por sua vez, recebe o nome de Mercúrio pelos romanos. Em "A Milimetros de Mercúrio", os personagens são funcionários da Soneide, uma empresa de telemarketing que vende sonhos, tendo eles também sonhos de aspirações artísticas. Uma divertida crítica poética da sociedade moderna através de uma linguagem alegórica e absurda. Os personagens sofrem de pressão crescentes e acabam se defrontando com a coisa insensível dentro de cada um que assassina a subjetividade e os sonhos. A peça mais visual de Julio Conte.

8 de dezembro de 2010

HOJE ESTRÉIA(08/12): A Milímetros de Mercúrio

É hoje a estréia,
e no segundo caderno do ZH de hoje....

TRABALHO SOB PRESSÃO


Pensando em abordar, em sua nova peça, a pressão do cotidiano nas grandes cidades, o diretor e dramaturgo Júlio Conte buscou a metáfora ideal na tabela periódica. O mercúrio, elemento escolhido, tem, entre suas funções, a de medir a temperatura. Durante a construção do espetáculo, surgiram novas relações, como o personagem da mitologia romana de mesmo nome.

É assim, repleto de subtextos, que A Milímetros de Mercúrio estreia hoje, às 20h, na sala Carlos Carvalho da Casa de Cultura Mario Quintana, em Porto Alegre.

Depois de três espetáculos que considera parte de uma “trilogia urbana realista”, composta por Pílula de Vatapá (2007), Dançarei Sobre Teu Cadáver (2008) e Larissa Não Mora Mais Aqui (2009), Conte envereda por uma outra linguagem. Tem duas certezas: está deixando de lado, pelo menos provisoriamente, o realismo e vive uma fase prolífica.

– Fiz uma peça em cada um dos últimos quatro anos, um ritmo mais intenso do que estava acostumado – afirma. – Com A Milímetros de Mercúrio, tenho a impressão de que começo um outro ciclo.

Os personagens da peça são funcionários de uma empresa de telemarketing que vende sonhos e são eles mesmo sonhadores com aspirações artísticas. Mas a pressão do ambiente de trabalho ameaça transformá-los em autômatos. Quando se deixa de sonhar, agora no sentido mais literal, algo se perde.

– No pensamento psicanalítico, o sonho é a possibilidade de se reorganizar o universo emocional. O sonho é a realização de um desejo – diz Conte, também psicanalista.




Direção: Julio Conte
Assitente de Direção: Catharina Cecato Conte

7 de dezembro de 2010

8 de novembro de 2010

A Milímetros de Mercúrio


A Milímetros de Mercúrio é a nova peça de Julio Conte. O mercúrio é um metal pesado que provoca intoxicação, debilitando o corpo e a mente e leva à morte. O trabalhador que lida com o mercúrio metálico é o mais exposto aos vapores invisíveis desprendidos pelo produto. Eles são aspirados sem que a pessoa perceba e entra no organismo através do sangue, instalando-se nos órgãos. O intoxicado pode apresentar sintomas como dor de estômago, diarréia, tremores, depressão, ansiedade, gosto de metal na boca, dentes moles com inflamação e sangramento nas gengivas, insônia, falhas de memória e fraqueza muscular, nervosismo, mudanças de humor, agressividade, dificuldade de prestar atenção e até demência. No sistema nervoso, o produto tem efeitos desastrosos, podendo causar desde lesões leves, até à vida vegetativa e à morte. O mercúrio também é usado para medir a pressão. Serve também para medir a temperatura. E em condições especiais de temperatura e pressão qualquer elemento pode mudar de estado. E é sobre isso que a pesquisa se dirigiu. Pessoas cheias de sonhos que se expõe à intoxicação da exigência de produtividade, a competição, ao stress do nosso cotidiano. Os personagens da peça trabalham numa ficcional empresa de telemarketing que vende sonhos a uma comunidade desprovida de esperança, na qual tudo que é humano acaba por se coisificar. Movidos por sonhos, eles tratam de construir um futuro, mas a pressão interna e externa leva o sujeito a transformações, e neste momento a coisa se a manifesta. Sob a metáfora do telemarketing, na qual predomina a impessoalidade, a coisa encontra o espaço ideal de manifestação e brutaliza a todos, num efeito oposto ao sonho que supostamente deveria vender sonho. Metáfora, nonsense e poesia se articularam em cena. Todos os sonhos relatados são verídicos.

O grupo de pesquisa na Cômica Cultural que já está no seu quarto ano. Desses grupos, já surgiram as peças "Pilula de Vatapá", "Dançarei Sob Teu Cadáver" e "Larissa Não Mora Mais Aqui", encerrando a trilogia urbana.

Esse ano, sob nova poética surge "A Milímetros de Mercúrio". Propostas novas. Foi a partir de sonhos coletados num site, onde sonhadores postam anomimamente os seus, tratamos de reconstruir o sujeito do sonho. Este sujeito foi colocado numa sala de telemarketing da Soneide. Todos sonham dormindo e acordados, mas a vida é cruel, e o despertar súbito. A distância entre o quê os personagens desejam e o que eles possuem é a tão grande que, em meio a sonhos e devaneios, algo se cria dentro de cada um.
Elenco: Alessandro Peres, Gisela Sparremberger, Guega Peixoto, Fabrizio Gorziza, Duda Paiva, Vanessa Cassali e Jordan Martini.

Direção: Julio Conte
Assitente de Direção: Catharina Cecato Conte