fonte: Julio Conte
Depois de duas semanas de apresentações, começo a entender (um pouco) a peça que fizemos. A MILÍMETROS DE MERCÚRIO é desenhada a partir de imagens narradas em sonhos. Sonhos postados na internet por sonhadores anônimos. A proposta era, a partir dos sonhos encontrar o sonhado. Para isso, os sonhos sofreram desdobramentos realizados em sala de ensaio pelos atores de modo a estabelecer ligações com a história de cada um. As palavras encontras dentro de cada sonho serviam de ponto de partida para o futuro, para infância, para pedaços da vida a demandar significado. Sendo assim, dentro da narrativa de cada um dos personagens, alguns elementos de repetem num horizonte aberto, criando padrões narrativos elípticos. Estes elementos funcionam como o fato selecionado do matemático Henri Poincaré dando uma coerência (mesmo que temporária e parcial) ao conjunto narrativo. O resultado esperado é que na mente de cada espectador ocorra uma edição de narrativas visuais, cênicas, musicais, literárias de modo a constituir, inventar, criar a sua própria peça. A idéia que, pelo menos em parte isso se realiza, se expressa na percepção do público através de frases ditas depois das apresentações. As frases têm em comum a idéia de que alguma coisa não foi compreendida. E por simetria, algo foi captado. O espectador encontra-se assim frente à criação de sua própria narrativa, mas como não é habitual que o faça em parte por não se sentir autorizado a encontrar em si mesmo o eixo essencial das imagens oferecidas. Como se o espectador estivesse frente a um banquete exótico, e mesmo saboreado os pratos estranhos, ficasse intrigado em como fazer a digestão sem saber os nomes dos mesmos. Esse processo se estabelece na medida que as elipses narrativas criam um padrão invisível. Sonho como uma narrativa baseado na teoria do Caos na qual os padrões não sejam lineares e os processos de repetição não tenham uma relação tempo-espacial, mas sim num ambiente emocional propício para o encontro consigo mesmo. Desse modo, que quando cada personagem criado a partir dos sonhos que serviu de base para que o ator tentasse encontrar o sonhador, encontra-se também o imponderável e a falta de sentido. A falta de sentido é a condição inicial para a busca de significado. E nesta busca encontra as elipses oníricas que constituem, em ultima análise, a essência do sujeito do modo como ele essencialmente é. Por isso, as personagens são essência de um humano que correm, porém o risco de a qualquer momento de deixar de sê-lo. Tão instável que somos em nossas impermanêcias.
texto: Julio Conte
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